quarta-feira, 30 de julho de 2014

O sofrimento da natureza

    Durante muito tempo os recursos naturais foram explorados visando às necessidades dos seres humanos, orgulhosos de dominar a natureza pela sua inteligência e saber. Com o desenvolvimento das ciências e da industrialização, exacerbou-se o processo de exploração dos recursos naturais. Aos benefícios do progresso acelerado contrapôs-se uma realidade sombria: os efeitos de uma lenta mas progressiva destruição da natureza.
    Os sinais mais evidentes alarmam os cientistas e estimularam as discussões sobre ecologia e ecoética, estudos que se concretizaram na década de 1970 inicialmente na Europa. América do Norte e Austrália. O grande perigo que atemorizava tinha muitas faces: erosão do solo, poluição das águas e do ar, aumento do efeito estufa, chuvas ácidas, acúmulo de materiais não biodegradáveis, lixo atômico e eletrônico, espécies de fauna e flora em extinção, diminuição da diversidade biológica. Enfim, a degradação ecológica.
    São evidentes os prejuízos para os seres humanos e animais, que já sofrem as consequências funestas como doenças, muitas vezes letais. Além de que furacões, inundações e outros desastres estão ocorrendo com mais intensidade e frequência nos últimos tempos.
    O que é isso senão a morte lenta da natureza?
    Outra questão muito discutida é a dos direitos dos animais. Diversos pensadores debruçam-se sobre os meios de coibir os maus-tratos e a matança deles por motivo fútil, como luxo ou prazer. Nesse rol estão o comércio de casacos de pele, o esporte da caça, os rodeios, as touradas. Mas não só. O filósofo Peter Singer, entre outros, condena o abate de animais com a finalidade de nos servir de alimento.
 
(Filosofando,Maria Lúcia de Arruda Aranha,Maria Helena Pires Martins,Capítulo 8,O sofrimento da natureza,página 103)


domingo, 27 de julho de 2014

O processo de filosofar

Kant, filósofo alemão, assim se refere ao filosofar:

Não é possível aprender qualquer filosofia;[...] só é possível aprender a filosofar, ou seja, exercitar o talento da razão, fazendo-a seguir os seus princípios universais em certas tentativas filosóficas já existentes, mas sempre reservando a razão o direito de investigar aqueles princípios até mesmo em suas fontes, confirmando-os ou rejeitando-os.

   Em que essa citação de Kant pode orientar seu contato com a filosofia? Ela serve para advertir que, mesmo estudando o pensamento dos grandes filósofos-eéimportantequeseconheçaoquepensaram-, você mesmo deve aprender a filosofar, exercer o direito de refletir por si próprio, de confirmar ou rejeitar as ideias e os conceitos com os quais se depara. Em outras palavras, a filosofia é sobretudo a experiência de um pensar permanente.
  Mais que um saber, a filosofia é uma atitude diante da vida, tanto no dia a dia como nas situações-limite, que exigem decisões cruciais. Por isso, no seu encontro com a tradição filosófica, é preferível não recebê-la passivamente como um produto, como algo acabado, mas compreendê-la como processo, reflexão crítica e autônoma a respeito da realidade.

Situação-limite. Expressão que se refere a situações extremas de adversidade, como a ameaça de morte, uma doença, a perda de um ente querido, experiências que modificam nosso olhar sobre nosso cotidiano.

(Filosofando,Maria Lúcia de Arruda Aranha,Maria Helena Pires Martins,Capítulo 1,O processo de filosofar,página 19)




sábado, 26 de julho de 2014

Como é o pensar do filósofo?

   Leia o relato do filósofo francês André Comte-Sponville:  

  Um jovem professor de filosofia passeia com um amigo e encontra um camponês, que seu amigo conhece, lhe apresenta e com qual nosso filósofo troca algumas palavras.
-O que o senhor faz?- indaga o camponês.
-Sou professor de filosofia.
-Isso é profissão?
-Por que não? Acha estranho?
-Um pouco!
-Por quê?
-Um filósofo é uma pessoa que não liga para nada...
 Não sabia que se aprendia isso na escola.

   O que é um filósofo? É alguém que pratica a filosofia, em outras palavras, que se serve da razão para tentar pensar o mundo e sua própria vida, a fim de se aproximar da sabedoria ou da felicidade. E isso se aprende na escola? Tem de ser aprendido, já que ninguém nasce filósofo e já que a filosofia é, antes de mais nada, um trabalho. Tanto melhor, se ele começar na escola. O importante é começar, e não parar mais. Nunca é cedo demais nem tarde demais para filosofar, dizia Epicuro [...]. Digamos que só é tarde demais quando já não é possível pensar de modo algum. Pode acontecer. Mais um motivo para filosofar sem mais tardar.
  O texto de Sponville termina com uma constatação: a de que só não filosofam aqueles para quem "já não é possível pensar de modo algum". Nesse ponto, cabe a pergunta: afinal, só pensa e reflete quem filosofa? É claro que não, já que você pensa quando resolve uma equação matemática, reflete criticamente ao estudar história geral, pensa antes de decidir sobre o que vai fazer no fim de semana, pensa quando escreve um poema.
  Então, que tipo de "pensar" é esse, do filósofo? Não é melhor nem superior a todos os outros, mas sim diferente, porque se propõe a "pensar nossos pensamentos e ações". Dessa atitude resulta o que chamamos experiência filosófica. Ao criar ou explicitar conceitos, os filósofos delimitam os problemas que os intrigam e buscam o sentido desses pensamentos e ações, para não aceitarem certezas e soluções fáceis demais.
 
(Filosofando,Maria Lúcia de Arruda Aranha,Maria Helena Pires Martins,Capítulo 1,A experiência filosófica,página 15)

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Em busca da felicidade

O que significa ser feliz? 

"Feliz aniversário","Feliz Ano-Novo","Felicidades".
    As saudações são nossos votos para aqueles que estimamos. E desejamos o mesmo para nós: ser feliz. Mas é possível ser feliz? Em que consiste a felicidade?
    Alguns, mais pessimistas, acham a felicidade um sonho impossível. Os problemas do cotidiano, os sofrimentos físicos e morais, a fome, a pobreza, a violência, o tédio são empecilhos severos. Mas será que mesmo essas pessoas não têm um fiapo de esperança de ter uma vida melhor?
    Para outros, como vemos na publicidade, a felicidade estaria nos momentos de consumo, longe do trabalho, com todo o conforto e prazer que o dinheiro pode lhes dar: um carro, um iate, roupas de marca, ausência de sofrimento, um doce "nada fazer"...Por isso tantos esperam as férias, a aposentadoria ou o prêmio da loteria.
   Como explicitação dessa felicidade fantasiosa, em algumas revistas os famosos estampam apenas sorrisos, enquanto em outras é exposta com certa crueldade a intimidade de relações malsucedidas, brigas, internações para tratamento de dependência de drogas ou para mais uma cirurgia plástica, na luta contra o envelhecimento.
   Pelos consultórios médicos passam pessoas com estresse, a doença do nosso tempo. O enfrentamento de depressões desemboca na banalização do consumo de psicofármacos - as "pílulas da felicidade". Sob essa última perspectiva, a felicidade é vista pelo se avesso: como a não dor, o não sofrimento, a não perda. De certo modo, representa a adequação das pessoas a comportamentos padronizados, ao que Nietzsche chamaria de "felicidade de rebanho".

Para refletir 

No livro Admirável mundo novo, de Aldous Huxley, as pessoas permanecem sempre jovens e são "felizes" porque tomam o soma, uma droga que impede a manifestação da tristeza e do sofrimento. Seria isso a felicidade? 

   Ao contrário dessa busca cega, a felicidade encontra-se mais naquilo que o ser humano faz de si próprio e menos no que consegue alcançar com os bens materiais ou o sucesso. Não se veja aqui a acusação de que rico não pode ser feliz nem o elogio ao despojamento ou à pobreza. Queremos dizer que, no primeiro caso, apenas as posses não nos tornam felizes, porque a riqueza nunca é um bem em si, mas um meio para nos propiciar outras coisas.
   O que se percebe é que na busca da felicidade muitas vezes as pessoas dela se afastam. A esse respeito, diz Aristóteles:
  
  "Ora, esse é o conceito que preeminentemente fazemos da felicidade. É ela procurada sempre por si mesma e nunca com vistas em outra coisa, ao passo que à honra, ao prazer, à razão e a todas as virtudes nós de fato escolhemos por si mesmos [...]; mas também os escolhemos no interesse da felicidade, pensando que a posse deles nos tornará felizes. A felicidade, todavia, ninguém a escolhe tendo em vista algum destes, nem, em geral, qualquer coisa que não seja ela própria." 

  Conforme a ética aristotélica,conhecida como eudemonismo, as ações humanas tendem para o bem e o bem supremo é a felicidade. E esta significa a realização da excelência (o melhor de si), que é a sua natureza de ser racional. 

Etimologia 
Eudemonismo. Do grego eudaimonia, "felicidade".